quarta-feira, 30 de maio de 2007

Lin-Tchi-Fá

Jardim de Lou Lim Ieoc, Macau. Maio de 2007


Lótus! Flores da noite, flores sagradas
De folhas verdes, longas, espalmadas.
Flores brancas e rosadas, flores de lago,
Que a lua beija e despe numa afago.

(...)

Cobrindo os lagos quietos, azulados,
Ó flores de lótus de botões rosados,
Lembrais-me... seios castos, virginais,
Pombas brancas fugidas dos pombais.

(...)

Maria Anna Acciaioli Tamagnini. Lin Tchi Fá. Flor de Lótus. Editorial Tágide, 2006

Anúncios e Tabuletas

«Canto de Felicidade - Vesidos de Noiva», na Rua de Sacadura Cabral, Macau. Maio de 2007

domingo, 27 de maio de 2007

As mãos de Lam Seng


«(...)
Até que o segredo veio parar às mãos de Lam Seng. Que continuava a fazer os bonequinhos de massa tal qual Liu Shih os fizera. Lam Seng nada sabia de Liu Shih. Mas ouvira o pai e o avô garantirem que aquele que iniciara aquela arte se perdia já na noite dos tempos.
Mais lhe tinham garantido o pai e o avô: que ele era agora o único a estar na posse do segredo.
(...)
Hoje Lam Seng já não é o jovem que, há mais de vinte anos, assentou a sua banca naquela esquina de Macau, ali no Largo do Senado.
Hoje os anos já pesam sobre ele e as pessoas chamam-lhe, carinhosamente, o «tio Lam».
Mas das suas mãos continuam a sair bonequinhos de massa como mais ninguém os faz.
(...)».
Alice Vieira. «As mãos de Lam Seng». Contos e Lendas de Macau. Editorial Caminho, 2002.

Contos e Lendas de Macau

terça-feira, 22 de maio de 2007

Festeja-se um deus budista, levanta-se um grande barracão

«Ali para os lados do povo de Patane, defronte do pagode de Ling-Cae, festeja-se um deus budista, levanta-se um grande barracão para representações teatrais. É sempre este o pretexto. As confrarias, no louvável propósito de divertirem os santos e de angariarem pecúlio, escolhem os dias memoráveis, que põem em alvoroço os fiéis, para erguerem teatros e contratarem companhias; o local é a rua, geralmente o terreno plano, que de regra defronta com o templo.
O teatro é uma vasta construção de bambu, coberta depois de colmo e esteiras; ergue-se em quatro ou cinco dias, e em igual tempo se desfaz, no fim da festa; tão sólido que resiste aos embates de milhares de curiosos, embora não se aplique um único prego, um único parafuso, ligadas tábuas e varas simplesmente por fibras de rotim. Ao fundo levanta-se o estrado para a cena; de cada lado um outro grande estrado, para os espectadores, divididos por sexos; e fica ao centro um espaço livre, descoberto, para a ralé que não paga, e que por ali irrompe, numa onda compacta de muitas centenas de cabeças.
(...)
Estudemos a cena. Não há bastidores, não há quase cenário; o espectador, advertido por certas convenções, um bambu figurando um cavalo, um cortinado figurando uma cama, tem de imaginar o resto; árvores em jardins, portas de entrada, escadarias, aqui uma ribeira, além uma colina, tudo se imagina. Não há actrizes (*); os papéis de mulheres são dados a homens, educados no disfarce; sendo tido por incompatível o belo sexo com a profissão, julgada ínfima. A música, a um canto, atordoa os ares, e ao compasso das suas flautas, dos seus atãs, ergue-se a voz intencionalmente em falsete dos figurantes, acompanhada dos gestos mais bruscos, das mímicas mais truanescas, que parecem constituir a suprema perfeição destes excêntricos. E contudo, ouvida a peça, traduzida por um meu companheiro prático na língua e nos costumes, mais uma vez me convenci de que não há originalidades; os povos destacam-se uns dos outros pela sua aparência, por simples divergências superficiais; no fundo, no seu modo de sentir, mostram-se sempre irmãos. Imaginem que estas estranhas representações, que tanto impressionam a nossa curiosidade de ocidentais, dariam, com um mero trabalho de tradução e adaptação, excelentes operetas para a Trindade, ao puro sabor dos alfacinhas». [Dezembro de 1890]
Wenceslau de Moraes. «Na Rua». Traços do Extremo Oriente. Parceria A. M. Pereira, 2ª edição, 1971

(*) Até 1901, só aos homens era permitido serem actores; foi em Xangai, que nesse ano, surgiu a primeira companhia de teatro, exclusivamente feminina.

segunda-feira, 14 de maio de 2007

A Colina do Vento e do Fogo

Macau, Templo de A-Má, Maio de 2007


«A pequena elevação, no sopé da qual foi edificado o templo da Barra, é conhecida entre os chineses pelo nome de Fông-Fó-Kóng, isto é, a Colina do Vento e do Fogo e, todos os anos, no dia da festa da deusa Má, era costume, após a oferta das ablatas, espalharem-se os peregrinos, em alegre garrulice, pela encosta acima, já para admirar a bela paisagem, que dali se disfruta já para buscar sítio abrigado do sol, para se deliciarem, sossegadamente, com os saborosos petiscos dos seus bem providos farnéis.

Diz a tradição que houve uma época em que os indivíduos que ascendiam até ao cimo do montículo, onde não medram ervas nem arbustos, mas só musgos e fungos em esquecidas anfractuosidades dos ásperos penedos que ali se encontram esparsos, costumavam regressar perseguidos por violentas dores de cabeça e atacados de maleitas quase sempre incuráveis.

Houve um dia, porém, em que um pescador, que morava numa humilde barraca, construída sobre os rochedos que abundavam na falda daquela colinazinha, se lembrou de queimar panchões sobre toda a encosta, convencido de que por esta forma conseguiria depurar os obnóxios ares daquele sítio, afugentando assim, duma vez para sempre, os espíritos malfazejos e causadores de tão estranhas doenças. Porém, qual não foi o seu espanto, quando viu surgir, por entre a fumarada provocada pela queima de panchões, três enormes e asquerosas áspides a serpearem assustadiças e com toda a rapidez pela encosta acima, a fim de se refugiarem por entre os penhascos do cume.

Divulgada a notícia do aparecimento daqules três abomináveis répteis e, sendo conhecido o facto de se encontrar em Macau um hábil caçador de ofídios, que viera de Héong-Sán com o fim de comprar enxofre de que necessitava para o exercício da sua profissão, convieram os moradores da Barra em convidá-lo para caçar aquelas desalmadas serpentes que, com o seu venenoso hálito, estavam empestando a Colina do Vento e do Fogo.

Não foi difícil encontrar o caçador de ofídios, pois, todas as tardes, no terreiro em frente ao templo de Kuán-Tái, mantinha ele o interesse de numeroso e entusiástico público, com as habilidades das suas numerosas cobras domesticadas, ao mesmo tempo que ia apregoando vários elixires, ungentos e emplastros de comprovada eficácia, segundo asseverava, na extinção das mais renitentes dores de toda a espécie e cujo segredo de preparação com o fel daqueles animalejos só dele era conhecido.

Os moradores do sítio da Barra trataram então de o abordar sobre o assunto que tanto os interessava e, após demoradas negociações, o caçador de ofídios acabou por lhes aceitar a proposta.

Hospedaram-no, então, na melhor casa do sítio e, durante os dias da sua permanência, esmeraram-se todos em o obsequiar com apetitosos manjares e inebriantes vinhos, procurando evitar quaisquer melindres, não fosse o homenzinho agastar-se e retirar-se, sem dar cabo das prejudiciais serpentes.

Bem tratadinho, o caçador de ofídios ia deixando passar os dias sem nada fazer, até que um dia, tendo já vendido aos seus hospedeiros todos os medicamentos e emplastros que trouxera consigo, resolveu ascender ao cume da colina para caçar as serpentes. Porém, nunca ninguém o viu regressar, e, daí em diante, ouviam-se, pela calada da noite, aflitivos gemidos e confrangedores lamentos naquela colina como se fossem soltados por qualquer alma penada, o que fazia encolher de pavor os timoratos espíritos dos moradores daquele local tão ermo, continuando, no entanto, as serpentes a exercer os seus malefícios aos homens que ousassem aventurar-se pelas vertentes da Colina do Vento e do Fogo.

Desesperados com tal flagelo, resolveram então os habitantes da Barra procurar o prior duma bonzaria desta cidade, afamado pelo seu profundo saber e pela sua grande austeridade, que lhes explicou que tais serpentes eram simples transmigrações duns seres imortais que, de natureza, nada tinham de calamitosas, mas, ao verem-se perseguidas pelos homens que queriam exterminá-las, violando-se assim o preceito que proíbe matar os seres vivos, foram obrigadas a defenderem-se, ejaculando aqueles tóxicos vapores por toda a colina. O bonzo aconselhou então os representantes dos moradores da Barra a deixarem em paz as serpentes, na certeza de que elas deixariam de fazer mal. Ninguém, porém, ficou convencido com as palavras do bonzo, tanto mais que dali em diante morriam muitos dos moradores da Barra sem se saber porquê.

Tempos depois, apareceu à procura dos residentes dessa localidade um desconhecido que se dizia ser natural de Tông-Kun e que, tendo chegado a Macau, também com o fim de comprar enxofre, fora informado que andavam serpentes pela Colina do Vento e do Fogo. Prontificou-se o homem a caçá-las mediante a vultuosa recompensa para aquela época de dez cates de enxofre de superior qualidade e sem mistura alguma, além da quantidade indispensável para o bom desempenho da sua perigosa tarefa.

Quotizaram-se então os residentes da Barra para a aquisição do enxofre preciso e, estando prontos os preparativos, juntaram-se uma tarde uns cem destemidos rapazes e, assim que o sol deixou de chamejar sobre a colina, trataram de espalhar, nimiamente, o pó de enxofre em volta de toda a colina, lançando-lhe, em seguida, o fogo.

O caçador de ofídios, sem levar arma alguma consigo, meteu-se afoitamente pela encosta acima e, horas depois, regressava ancho e sorridente daquela entuna tão pouco acidentada, a fim de seleccionar dez mocetões dos mais avantajados para o acompanharem até ao alto daquela eminência, donde desceram daí a pouco, ofegantes e ajoujados com o peso de três serpentes que mediam mais de dez braços de comprimento e pesando para cima de cem cates cada uma, as quais vinham napeiras como se tivessem sido narcotizadas.

O caçador de ofídios teve de fretar especialmente um barco para levar para a sua terra aquelas enormes e preciosas serpentes, bem como o enxofre que recebera, como recompensa do seu bom trabalho.

No ano seguinte, voltou, trazendo consigo várias bilhas de vinho que distribuiu, generosamente, pelos moradores da Barra, dizendo-lhes que tal bebida, preparada com o fel das serpentes que caçara, era um poderoso tónico capaz de restituir a saúde, mesmo a um moribundo.

Com a bem sucedida caçada que se fez às três maléficas serpentes, a Colina do Vento e do Fogo ficou completamente sanada de deletérias emanações, passando a poder ser frequentada, impunemente, por toda a gente e, com o tempo, foram surgindo habitações nas suas vertentes, não constando terem até hoje havido quaisquer doenças estranhas ou pestilências naquele bairro.».

Luís Gonzaga Gomes, «A Colina do Vento e do Fogo», in Lendas Chinesas de Macau, Notícias de Macau. 1951

sexta-feira, 11 de maio de 2007

Tabuletas

«Quinqilapia Kei Mei Hong», Travessa do Matadouro. Macau, Maio de 2007

quarta-feira, 9 de maio de 2007

Altar

Macau, Calçada de S. Francisco de Xavier. Maio de 2007