quarta-feira, 31 de maio de 2006
O Pequeno Kun Iam
Ao invés de vasos com plantas ou flores, ou de tanques com lótus, dois enormes jamboleiros preenchem por completo o pequeno pátio do Kun Iam Ku Miu.
«Macau em Maio»
e de acácias rubras
e de chagas de melancolia nos muros velhos.
Teus longos braços novos de betão e vidro
rompem a bruma matinal
por sobre os restos da antiga beleza.
Fernanda Dias. in Antologia de Poetas de Macau.
terça-feira, 30 de maio de 2006
Estória di Maria co Alféris Juám
Juám sã unga alféris di Bataliám (vinte cinco áno na-más), arto, ôlo grandi, cabelo marêlo-ôro, co unga bigode grosso tamêm aloraça. Já vêm di Portugal, têm na Macau dôs áno fora, não sabe falá china, nunca intendê nôsso língu maquista. Sorte qui Maria já vai escola na Convento Santa Clara, já prendê torá portuguêz pa podê papiá co su quirubim di bigode grosso.
(...)
Maria já conhecê estunga Juám têm perto cinco mês, unga domingo na adro di Sé, quelora cavá missa-tropa. Na dentro di greza, Juám olá Maria, nom-pôde largar ôlo; Maria virá cara sã ta olá acunga dôs ôlo lustro ta contemplá êle, raganhado.Tudo dôs nom-pôde uví missa bêm-fêto».
José dos Santos Ferreira (Adé). «Estória di Maria co Alféris Juám», Macau di Tempo Antigo (Poesia e Prosa) - Dialecto Macaense -, Edição do Autor, Macau, 1985
quelora - quando; no momento em que.
cavá - depois; em seguida (Cavá vem de «acabar»)
estunga - este ou esta
greza - igreja
lustro - que tem brilho; luzidio
Olá - ver, olhar. Olá bem-fêto! - vejam bem!
Ôlo - olho
quelora - quando; no momento em que.
raganhado - arreganhado
sã - do verbo ser.
tá - do verbo estar
torá portuguêz - à letra seria «torrar o português»; diz-se da pessoa que se esforça em falar correctamente o portugês, com pronúncia afectada.
domingo, 28 de maio de 2006
Hong Kung, o deus guerreiro

Jardim de Lou Lim Ieoc

João Aguiar. «O Deus dos pássaros». Rio das Pérolas. Livros Oriente. pág. 27
Jardim de S. Francisco

No ano de 1935 assistiu-se à destruição do coreto e à dissolução da banda municipal; nesse mesmo ano foi autorizada a construção da via pública de S. Clara, retalhando-se, para esse efeito, o jardim.
____________
(1) Henrique de Senna Fernandes, «Uma Pesca ao Largo de Macau». Nan Van. Instituto Cultural de Macau. 1997, pág. 32
«Eu chamava-a simplesmente a Árvore»
«Eu gostava muito da parte superior do Jardim de S. Francisco, paredes-meias com a Rua Nova à Guia. A área era mais larga que hoje, cobria a Calçada do Quartel que não existia, e estava separada da ala das residências dos oficiais, por um muro formando beco. Havia ali um jardim frondoso e bem tratado com áleas, onde se aprumavam frangipanas e bauínias entre arbustos e outra vegetação. As frangipanas davam as chamadas "flores de S. João" branco-amarelas, de cheiro capitoso. As bauínias abriam as suas flores arroxeadas ou róseas na Primavera e eram um regalo para os olhos. As champacas misturavam-se com as roseiras. Sebes de camélias e damas-da-noite dividiam os caminhos. Pairava no ar uma confusão de aromas inebriantes. De manhã à noite, desbobinava-se a sinfonia zangarreante das cigarras, em labor incansável, desmentindo a fábula conhecida. Nos bancos verdes e já veneráveis, sentavam-se os anciãos chineses que traziam, em gaiolas grandes e pequenas, algumas artisticamente ornamentadas, os seus pássaros favoritos - rouxinóis, chevites, melros, canários e outros - que trinavam à compita com a passarada livre, derramada pelas árvores. Eternamente, as borboletas saltitavam de flor em flor, à procura do pólen. (...) Por entre aquela vegetação abundante, sobressaía a maior árvore de pagode que jamais vi em Macau, à excepção da do Seminário de S. José. Eu chamava-a simplesmente a Árvore. Alta, tronco grossíssimo, bem copada, a ramaria espraiando-se largamente para o céu, a sombra hospitaleira e benigna em círculo, abrigando os passeantes da canícula ou da chuva. Em cima havia sempre chilreada dos passarinhos que construíam ninhos inacessíveis à garotada. O tronco secular tinha reentrâncias e nós que permitiam fácil escalada aos primeiros ramos. Eu costumava trepar por ele acima muito ágil e assentava-me num dos ramos gozando a altura e o panorama. (...) Mais tarde, homem feito, quando regressei de Portugal depois de uma ausência de oito anos e calhou visitar aquela parte do jardim, tudo estava praticamente irreconhecível. Existia ainda o gracioso edifício cilíndrico, mas a vegetação fora desbastada e não restava o mínimo vestígio da Árvore. Sabe-se lá porque tinha sido derrubada. Sofri um golpe doloroso na sensibilidade. Desaparecera para mim a mais nobre árvore de Macau».
Henrique de Senna Fernandes, «Rua das Mariazinhas», Mong-Há. Instituto Cultural de Macau, 1998, págs. 75-76
sexta-feira, 26 de maio de 2006
Macau Património Mundial: Quartel dos Mouros
Horário: das 9:00 às 18:00 horas (Varanda)
O Centro Histórico de Macau
Cidádi di Nómi Sánto
«Nôsso Macau, nómi sánto,
Vosôtro olá!
Qui ramendá unga jardim;
Fula fresco na tudo cánto
Sã pa ispantá,
Sai semeado, nom têm fim.
Gente di Macau, na passado,
Co tánto lágri já regá
Su fula cherôso, abençoado,
Qui Dios já ajudá semeá.
No mundo assi transtornado,
Sã fazê triste coraçám
Olá gente falá cuidado,
Dessa fula muchá na chám.
(...)
quarta-feira, 24 de maio de 2006
A Fonte do Lilau
«Quem bebe água do Lilau
Não mais esquece Macau:
Ou casa cá em Macau
Ou então volta a Macau.»
Lilau é nome que perdura no largo, e também, numa calçada, num beco e num pátio. Originariamente era Nilau, do cantonense Nei-lau - que significa «corrente de água do monte» -, e foi o primitivo nome da colina da Penha, designação que se manteve até à construção, em 1622, da ermida de Nossa Senhora da Penha.
Os chineses chamam-lhe o Poço da Avó (ou da Antepassada), designação particularmente interessante, já que o poço, ou fonte, localizava-se muito perto do templo de A-Má, ou Tin Hau, a Rainha Celestial, e A-Má, ou Má-chou, é o nome que, curiosamente, se atribui à Avó paterna, a primeira antepassada. Tal como o poço da Avó ou de Má-chou, a Antepassada, que é também a Rainha do Céu, simbolizando a união entre o Céu e a Terra, o nome de Nilau ou Nei-lau, se afigura, igualmente, como a união entre o monte e a água, ou seja, das águas que escorrem dos montes, das nuvens e do céu e se juntam à Terra.
Os nomes das ruas

P. Manuel Teixeira na Explicação Prévia à obra Toponímia de Macau.
Macau Património Mundial: Largo do Lilau

«Os depósitos de água subterrânea da zona do Lilau constituíam a principal fonte de água natural em Macau. A popular frase "Aquele que beber da água do Lilau, jamais esquecerá Macau" expressa bem a ligação nostálgica dos habitantes com o Largo. Esta área corresponde a um dos primeiros bairrros residenciais portugueses em Macau». in RC - Revista de Cultura, nº 15, Julho de 2005
terça-feira, 23 de maio de 2006
Má-Káu-Seak, o Rochedo do Cavalo no Coito
(2) Padre Manuel Teixeira. Toponímia de Macau, tomo 1, págs. 38-39
(3) Almerindo Lessa, citado por P. M. Teixeira.
(4) Em Sino-Portuguese Trade from 1514-1644: a Synthesis of Portuguese and Chinese Sources, 1934, T'ien-Tsê-Chang atribui o nome de Macau ao famoso rochedo «chamado Má-chião (...) ou Ma-Kao em cantonês».
(5) Padre Manuel Teixeira, ob. citada. pág. 39
segunda-feira, 22 de maio de 2006
Leal Senado

sexta-feira, 19 de maio de 2006
Igreja de S. Lourenço
Ao certo, não se sabe a data da sua construção, mas o Padre M. Teixeira, citando Frei José de Jesus Maria – Asia Sínica e Japónica -, diz que a igreja foi erecta entre 1558 e 1560, referindo-se à construção desta igreja, à de Stº António e à de S. Lázaro, «em o seguinte anno de 1558 até o de 60». Se foi ou não construída nesse período de tempo, não se sabe. Mas já existia em 1576, pois dela escreve um padre jesuíta ao Geral da Companhia: «(...) chamao os nossos cõ cãpaqinha pola cidade, & se faz a doutrina christãa, & se fazem alguas exortações, e isto assi na nossa igreja como na outra q, he de S. Lço. Martir, cõcorre mta.».
1) «The Parish Church of St. Lawrence at Macao», Journal of Oriental Studies, Volume VI, 1961-1964-Number 1 and 2. University of Hong Kong.
Macau Património Mundial: Igreja de S. Lourenço

«Construída pelos jesuítas em meados do século XVI, é uma das igrejas mais antigas de Macau. O seu presente aspecto é o resultado das obras efectuadas em 1846. Situada no litoral sul da cidade, na sua escadaria principal, na época com vista directa sobre o mar, costumavam reunir-se as famílias dos marinheiros aguardando o seu regresso, razão pela qual lhe foi dado o nome de Feng Shun Tang (Igreja dos Ventos de Navegação Calma). De estrutura neoclássica com um subtil tratamento decorativo de inspiração barroca, a sua escala e riqueza arquitectónica refletem a riqueza do bairro onde se inseria». in «RC - Revista de Cultura», nº 15, Julho de 2005.
Horário: das 10:00 às 16:00 horas (acesso pela Rua da Imprensa Nacional)
O Centro Histórico de Macau
quinta-feira, 18 de maio de 2006
Macau Património Mundial: Leal Senado
«Construído em 1784, este edifício albergou a primeira Câmara Municipal de Macau, função que ainda mantém. O nome "Leal Senado" deriva do título "Cidade do Nome de Deus de Macau, Não Há Outra Mais Leal" atribuído à cidade por D. João IV, em 1645. O Edifício do Leal Senado, de estilo neoclássico, conserva ainda as paredes-mestras e o traçado arquitectónico originais, incluindo o jardim situado no pátio traseiro.
No interior do edifício, no primeiro andar, além de um salão nobre que dá acesso a uma exuberante biblioteca em madeira ricamente decorada, ao estilo da biblioteca do Convento de Mafra (Portugal), existe ainda uma pequena capela». in «RC - Revista de Cultura», nº 15, Julho de 2005
Horário: Galeria - das 9:00 às 21:00 (encerra à segunda-feira); Jardim - das 9:00 às 21:00
O Centro Histórico de Macau
quarta-feira, 17 de maio de 2006
Templo da Barra
O verde dos bambus mais altos é azul
ou então é o céu que pousa nos seus ramos.
Eugénio de Andrade. Pequeno Caderno do Oriente.
Macau Património Mundial: Templo de A-Má

«Anterior ao estabelecimento da cidade de Macau, o Templo de A-Má é composto pelo Pavilhão do Pórtico, o Arco Memorial, o Pavilhão de Orações, o Pavilhão da Benevolência, o Pavilhão de Guanyin e o Pavilhão Budista Zengjiao Chanlin. Estes vários pavilhões, dedicados à veneração de diferentes divindades, formam um complexo único, o que faz do Templo de A-Má um caso exemplar da cultura chinesa inspirada pelo Confucionismo, Tauismo, Budismo e por múltiplas crenças populares». in «RC - Revista de Cultura», nº 15, Julho 2005.
segunda-feira, 15 de maio de 2006
sexta-feira, 12 de maio de 2006
quinta-feira, 11 de maio de 2006
Chunambeiro
San Má Lou
Rasgada em 1915, a Avenida de Almeida Ribeiro - nome do ministro das colónias, que na altura sancionou a verba para a expropriação das casas e para a abertura da avenida - começa na Praia Grande, onde esta avenida cruza com a do Infante D. Henrique, e termina no Porto Interior, em frente à Ponte-Cais nº 16, na Rua do Visconde de Paço de Arcos. Os chineses designam-na por San Má Lou, a «avenida nova», «estrada nova» ou «caminho novo para os cavalos».
Nesta avenida, que veio cortar a zona do bazar chinês, vieram instalar-se os mais luxuosos hotéis e os melhores estabelecimentos comerciais, sobretudo as joalharias.
terça-feira, 9 de maio de 2006
O dragão embriagado
Dia de festa, este 5 de Maio: foram as festividades do banho do Buda, foi a festa do dragão embriagado no templo de Sam Kai Vui Kun, ali junto ao Mercado de S. Domingos. E foram as festividades de Tam Kung, em Coloane.
A festa do Tchoi-Long, o dragão embriagado, que se realiza no oitavo dia do quarto mês lunar, está associada a uma lenda. Segundo essa lenda, Buda terá esquartejado o dragão enquanto este se banhava num rio; mais tarde, a cabeça e a cauda do dragão seriam encontradas por um pescador embriagado, que, por mais buscas que fizesse, nunca chegou a encontrar o resto do corpo do animal. Nesta festividade, que se deveria chamar do «pescador embriagado», e não do dragão, pois este nem uma pinga terá bebido, os pescadores, estes sim, embriagados, percorrem algumas ruas de Macau transportando apenas a cabeça e a cauda do dragão, numa animada dança em busca do corpo do dragão.
O templo de Kuan Tai, que se situa numa das ruas de acesso ao mercado de São Domingos (Rua Sul do Mercado de São Domingos), é um pequeno templo, construído em 1750 e restaurado por diversas ocasiões, também conhecido por Sam Kai Vui Kun, pois foi sede da associação Sam Kai – ou das três ruas: dos Mercadores, das Estalagens e dos Ervanários -, a associação mais antiga de Macau. No espaço que defronta o templo, normalmente ocupado por bancos e vedado para impedir o estacionamento de motorizadas, montou-se um palco onde, uma enorme azáfama se manteve ao longo do dia, sobretudo por parte das mulheres, em volta de enormes tabuleiros de comida. Duas enormes filas de pessoas aguardavam a distribuição da parte do repasto que lhes cabia. Uma espécie de bodo, como nas nossas festas do espírito santo, só que aqui não se come no local, cada qual leva a sua parte da refeição, em embalagens próprias.
terça-feira, 2 de maio de 2006
Viola Chinesa
Vai adormecendo a parlenda
Sem que amadornado eu atenda
A lenga-lenga fastidiosa
Sem que o meu coração se prenda,
Enquanto nasal, minuciosa,
Ao longo da viola morosa,
Vai adormecendo a parlenda.
Mas que cicatriz melindrosa
Há nele que essa viola ofenda
E faz que as asitas distenda
Numa agitação dolorosa?
Ao longo da viola, morosa...
Camilo Pessanha. Clepsydra.