"Apesar do frio que se fazia sentir naquela manhã de Fevereiro de 1662, a cidade do Santo Nome de Deus de Macau acordara alvoraçada com os preparativos das festas para o grande acontecimento do ano - o casamento de D. Catarina de Noronha com o rico mercador D. Francisco Vieira de Figueiredo. Não se tratava de um casamento qualquer.A noiva era filha de D. António Manuel da Câmara de Noronha, governador da cidade, cargo que desempenhava interinamente por eleição dos moradores, mas que exercera por designação da Coroa, de 1631 a 1636. Nobre de nascimento, a rondar já pelos sessenta e tal anos, viera para a Índia no início do século XVII e, em 1618, encontrava-se já a capitanear a Fortaleza de Manar, na ilha de Ceilão. Preocupado com o futuro e bem estar da família, numa cidade cada vez mais empobrecida por falta de comércio, não queria perder a oportunidade de casar a sua filha mais velha com um homem digno da sua esmerada educação. A passagem por Macau do europeu mais rico e famoso do Oriente era uma ocasião única, que não poderia deixar escapar".(...)"Era já lusco-fusco quando o novo casal recolheu a casa, momento que se dava por terminada a festa daquele dia. Transportados em liteiras de janelas bem rasgadas, para que todos os pudessem ver através das finas cortinas, os noivos fizeram a pequena viagem seguidos de numeroso cortejo nupcial, que, em constante algazarra, lhes ia atirando pétalas de flores. Mais do que os noivos, foi o chão que ficou coberto de um colorido manto, como se de uma procissão se tratasse. (...) As ruas estavam empilhadas de gente para os ver passar, iluminadas por tochas e balões vermelhos, alguns com luz interior, que brilhavam como pequenas estrelas. Ao som do rufar dos tambores e de tocadores de xian, o cortejo desceu a colina do Monte até à Sé, e daí seguiu para a Rua Central. Na época, esta rua começava na Fortaleza do Monte, passava pelo largo da Sé e curvava à direita para passar em frente da Santa Casa da Misericórdia, que então se estendia até à esquina do Senado da Câmara, único edifício construído dentro das muralhas em linhas orientais, e continuava a subir encurvando pela esquerda até à igreja de S. Lourenço".Maria Helena S. R. do Carmo. Uma Aristocrata Portuguesa no Macau do Século XVII. Nónha Catarina de Noronha. Fundação Jorge Álvares e Editorial Inquérito, 2006
Recriando o quotidiano macaense da segunda metade do século XVII, os costumes, hábitos, religião e festividades de Macau seiscentista, o romance centra-se na figura feminina de D. Catarina de Noronha, que se destacou "das senhoras do seu tempo, não apenas por ser esposa de um rico comerciante europeu com uma célebre carreira diplomática e militar no Oriente, mas pela forma como multiplicou a sua fortuna e conquistou a sua própria independência depois de viúva"*. Obra de ficção histórica, apoia-se numa investigação histórica rigorosa sobre a expansão marítima e o enquadramento de Macau no contexto político e económico da época.
* do Prefácio
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